PERIFERIAS EXISTENCIAIS
No início da Semana diocesana, (3 a 9 de Novembro), D. António
de Sousa Braga afirmou que desejava que esta semana fosse um momento de
reflexão sobre as periferias existenciais e que a igreja açoriana
fosse construída
pelas pessoas e não o resultado de “ofícios da cúria”.
“Como desencadear um processo de sinalização e
de caracterização, para se inserir nelas, com a luz do Evangelho? Como é que as
comunidades cristãs e os Serviços Pastorais chegam e se envolvem nas
periferias? O que se entende por periferias existenciais? Não está em questão
só a pobreza material”. Eis as interpelações do bispo diocesano.
Penso
que se deveria ter começado por definir: o que se entende por periferias
existenciais. Com efeito, em boa metodologia, primeiro se definem os
conceitos para, depois, se passar à construção das proposições e das teorias.
Os conceitos, ao contrário do que acontece com as teorias, não são nem falsos
nem verdadeiros, são mais ou menos úteis à investigação pretendida. No caso em
apreço, o que parece pretender-se é inserir-se nelas, com a luz do Evangelho.
O conceito foi “cunhado” pelo Papa
Francisco. Ele, de facto, insiste em convidar-nos a ir com uma consciência
renovada, onde talvez nunca fomos: às periferias do mundo e da existência. O Papa
Francisco tem-se revelado um homem carismático que procura aproximar-se das
pessoas, dos mais humildes e dos problemas mais profundos que angustiam o ser
humano.
O que se pode entender por Periferias Existenciais? Para Ivanaldo SANTOS[1],
a periferia existencial não é um bairro, uma rua, uma cidade ou outro
tipo de espaço na cidade ou no campo. A periferia existencial é o vazio da
vida, é a falta de sonho, de utopias, de esperança. Se aceitarmos a definição –
é uma das muitas possíveis – podemos concluir que o mundo está cheio de periferias existenciais. Uma delas é a pobreza. Não há nada mais
desesperante do que não ter que comer, não ter água para beber. Infelizmente,
ainda há milhões de serem humanos a viver em algum tipo de periferia, seja ela
urbana ou rural. Um outro tipo de periferia menos manifesta, que tem muita
dificuldade de se mostrar e, por vezes, não quer aparecer, é aquela periferia
que o Papa Francisco vê como uma das origens, na sociedade contemporânea, da
pobreza material. Trata-se da periferia existencial.
A nossa sociedade está cheia de
periferias existenciais. Está cheia de pessoas que têm casas confortáveis,
cheias de móveis, com geladeiras cheias de comida, com dinheiro, com carro,
etc... No entanto, não são felizes, vivem uma vida vazia, sem sonhos, sem
projectos que possam dar sentido à vida. Muitas vezes, essas mesmas
pessoas, para poderem suportar o vazio da vida e do quotidiano, precisam
recorrer a algum tipo de vício ou de experiência traumática, como, por exemplo,
o uso de drogas, o excesso de bebidas alcoólicas, o excesso de remédios
antidepressivos e coisas semelhantes.
O Papa convoca-nos a ir combater a
pobreza material, dentro das periferias materiais. No entanto, adverte que se as periferias
existenciais não forem alcançadas, se a pobreza existencial, a falta de sonho e
de esperança, não for combatida, muito provavelmente a pobreza material irá
crescer e se multiplicar.
Um dos dilemas que o
neo-existencialismo que mais perturba o homem contemporâneo é precisamente
aquilo a que o Papa chama de periferias existências,
ou seja: o
homem vazio, sem sonho, sem esperança. Para melhorar o mundo, é
preciso re-encantar o homem.
Esse homem que
precisa voltar a sonhar, a confiar em
Deus e a ter fé. Não basta ter casa e dinheiro, é preciso ter
fé em Deus e amor ao próximo. Um dos dilemas que o neo-existencialismo que mais
perturba o homem contemporâneo é precisamente aquilo a que o Papa chama de periferias existências, ou seja: o homem vazio, sem
sonho, sem esperança. Para melhorar o mundo, é preciso re-encantar o homem. Esse homem que precisa
voltar a sonhar, a confiar em Deus e a
ter fé. Não basta ter casa e dinheiro, é preciso ter fé em
Deus e amor ao próximo.
Foi bom que o Bispo de Angra
incentivasse todos os cristãos a serem evangelizadores e a aproveitarem a
semana para pensar “o que somos e o que fomos enquanto igreja particular”, já que “cada igreja particular é o reflexo da
cultura e da história do sitio em que se insere”. Se não sabemos o que somos,
dificilmente podemos criar um novo élan missionário que nos leve ao encontro de
todos os que estão, “por uma razão ou outra” nas periferias.
“Não queremos que existam
periferias”, escrevia D. António. Como cristãos, devemos comparecer às periferias
existenciais. A todas elas: às de ontem que ainda persistem: fome,
sede, prisões; e às novas que surgiram como o advento do individualismo
exacerbado, e que não são mais periferias físicas e geográficas.
Água
Retorta, 10 de Novembro de 2014
Pe. Doutor Octávio de Medeiros
Sociólogo
[1]
Ivanaldo, SANTOS, O Papa Francisco e as periferias existenciais, in: Fatos e Feitos,
ano II, n. 15, Março 2014, p. 9.
Comentários
Enviar um comentário