CATEQUESES QUARESMAIS DO BISPO DIOCESANO / IV Reflexão
IV
Reflexão
A MISERICÓRDIA NA MISSÃO DA IGREJA
Como explicava muito bem S. João Paulo II,
na Encíclica “Dives in Misericórdia” (DM), «a igreja vive vida autêntica,
quando professa e proclama a misericórdia, o mais admirável atributo do Criador
e do Redentor e quando aproxima os homens das fontes da misericórdia do
Salvador, das quais ela é depositária e dispensadora.
«Neste contexto, assumem grande significado
a meditação constante da Palavra de Deus e, sobretudo, a participação
consciente e reflectida na Eucaristia e no Sacramento da Penitência ou Reconciliação»
(nº 13).
1. Antes de mais, temos de ouvir e fazer
ouvir o Kerygma – o 1º anúncio – que nos traz a Boa Nova da infinita
misericórdia do Senhor, que não quer a morte do pecador, mas que se converta e
viva.
Neste sentido, são elucidativas as palavras
do Papa Francisco:
«Ao designar-se como “primeiro” este
anúncio, não significa que o mesmo se situa no início e que, em seguida, se
esqueceu ou substitui por outros conteúdos que o superam; é o “primeiro” em sentido
qualitativo, porque é o anúncio principal, aquele que se tem de voltar a ouvir
sempre de diferentes maneiras e aquele que se tem de voltar a anunciar sempre»
(Evangelii Gaudium=EG, 2013, nº 164).
2. Depois, temos a Eucaristia, “fonte e
centro da vida cristã, em que experimentamos a força salvadora e libertadora da
misericórdia divina, manifestada e realizada em Cristo, que, na Eucaristia
continua a dar gratuitamente a vida, para que tenhamos a vida com abundância.
«Mistério grande, mistério de misericórdia
(a Eucaristia)! Que mais poderia Jesus ter feito por nós?
Verdadeiramente, na Eucaristia,
demonstra-nos um amor levado até ao “extremo” (cf Jo 13, 1), um amor sem
medida…
«Por isso a Igreja tira força espiritual,
de que necessita, para levar a cabo a sua missão, da perpetuação do sacrifício
da Cruz na Eucaristia e da comunhão do Corpo e Sangue de Cristo» (João Paulo
II, Encíclica Ecclesia de Eucharistia, 2003, nn. 11 e 13).
3. É fundamental o anúncio do Evangelho da
misericórdia. Mas nós sabemos que em Jesus Cristo a Palavra “fez-se carne” (cf
Jo 1, 14). Assim também a palavra da Igreja adquire forma concreta nos Sacramentos.
Por isso, não podemos falar de misericórdia divina, sem aludir ao Sacramento,
por antonomásia, da Misericórdia, que é a Reconciliação.
Por isso, se quisermos viver esta Quaresma,
como “momento favorável” da misericórdia divina, não podemos deixar de celebrar
o Sacramento da Reconciliação.
Todos os sacramentos são Sacramentos da
Misericórdia de Deus. Mas, o Sacramento, por excelência, da misericórdia
divina, é o da Reconciliação. Efetivamente, com o poder das chaves, Jesus
entregou aos Apóstolos o poder de perdoar os pecados, em Seu nome. “Eu te
absolvo dos teus pecados”. É Jesus a falar pela boca do sacerdote: Eu te
perdoo; vai em paz!
4. «A Igreja deve ser o lugar da
misericórdia gratuita, onde todos se possam sentir acolhidos, amados, perdoados
e animados a viverem segundo a vida boa do Evangelho» (EG 114). São palavras do
Papa Francisco, que nos exorta continuamente a viver e a levar a misericórdia a
todos, sem distinção, privilegiando os que são deixados de lado.
Os primeiros cristãos, não só se chamavam
irmãos: procediam como irmãos. Conforme os Atos dos Apóstolos, ninguém passava
necessidade. Foi instituída a Ordem dos Diáconos, precisamente, para cuidarem
da distribuição dos alimentos a quem precisava.
Por isso, se dizia: ”Vede, como se amam”
(cf Tertuliano)! E na carta a Diogneto (séc. II ou III), se afirma que os
cristãos não eram pessoas estranhas: levavam uma vida normal, inseridos na sociedade.
Distinguiam-se dos outros, pela sua maneira de ser e de agir: “amam a todos e
são perseguidos por todos… São pobres e enriquecem a muitos; carecem de tudo e,
paradoxalmente, têm tudo com abundância…”.
Eis o caminho de uma Igreja, que deve viver
e promover “a cultura da misericórdia”, não apenas através da acção social e
caritativa, com especial atenção para com os últimos, mas também em toda a sua
maneira de ser e de agir. A Igreja é como atua.
Agradecendo mais uma vez a grande corrente
de oração, desencadeada na Diocese, pelas minhas intenções, peço-vos que, nesta
semana, vos associeis à minha acção de graças pelos tantos dons, recebidos com
o dom da vida, nomeadamente, a graça de ser Bispo da Igreja que me gerou para a
fé.
+ António, Bispo de Angra
Alfragide, 11 de Março de 2015.
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