CATEQUESES QUARESMAIS DO BISPO DIOCESANO / V Reflexão
V Reflexão
PROMOVER
A CULTURA DA MISERICÓRDIA
A
Diocese está procurando desencadear o processo de “sinalização e caraterização
das periferias existenciais” da sociedade açoriana. Não por pura curiosidade,
nem por mero assistencialismo. Trata-se de promover a pessoa humana, em toda a
sua dignidade e direitos. O que vai para além da justiça, que, a ser autêntica,
implica sempre o amor, que tem a sua máxima expressão na misericórdia.
É
verdade que o Magistério da Igreja, desde Leão XIII, insistiu muito sobre a
justiça social. Mas hoje é dado adquirido que, para chegar a uma sociedade mais
equitativa e fraterna, não basta a justiça. Aliás, costuma-se dizer: “summa
iustitia, summa iniuria”.
É
por isso que os últimos Papas insistem na “medicina da misericórdia”, como se
expressava S. João XXIII, na abertura do Concílio Vaticano II, ao explicar a
finalidade predominante da Assembleia Conciliar. E o beato Paulo VI começa a
falar da “Civilização do Amor”, expressão que S. João Paulo II repetirá
inúmeras vezes.
Concretamente,
escreveu a Carta Encíclica “Dives in Misericordia” (1980). Deliberadamente a 1ª
canonização do 3º Milénio foi a da Ir. Faustina Kowalska, a religiosa da
“Divina Misericórdia”. Seguindo a sua sugestão, S. João Paulo II fixou a Festa
da Divina Misericórdia no 2º Domingo de Páscoa.
E
Bento XVI, na sua 1ª Encíclica, “Deus Caritas Est” (DCE, 2005) deu um passo
decisivo, no sentido de apresentar, não só a justiça, mas também o amor, como
ponto de partida fundamental para a Doutrina Social da Igreja. E, na sua 3ª
Encíclica, “Caritas in Veritate” (2009), apresenta claramente o amor, como
princípio fundamental e caminho da Doutrina Social da Igreja.
«Para
ele, o amor é o princípio determinante, não só nas microrrealações, como a a
amizade, a família e os pequenos grupos, mas também nas macrorrealações, quer
dizer, em contextos sociais, económicos e políticos. Com isto, Bento XVI
introduziu na Doutrina Social da Igreja uma importante ideia que ajuda a
avançar.
«É
evidente que o «amor» não pode ser entendido como mero sentimentalismo, como
puro sentimento… O amor, como princípio da Doutrina Social da Igreja não
substitui, como é óbvio, a justiça. Antes, pelo contrário a justiça é medida
mínima do amor; o amor, por seu lado, é a medida transbordante. O amor não se
fica aquém da justiça devida aos outros, mas transcende-a. Por isso, não se
trata de um acrescento, nem de um apêndice à justiça. Enquanto pessoa, o outro
não depende só dos bens terrenos, mas também do dom do amor. Por isso, o amor,
que ultrapassa gratuitamente o exigido por lei, é forma adequada à pessoa do
outro. É neste contexto que Bento XVI fala da lógica do dom» (Card. Walter
Kasper, Misericórdia, Condição Fundamental do hoje, mais do que nunca, para
abrir caminhos novos de justiça social, urge partir e ter como meta final o
amor, que tem a sua máxima expressão na misericórdia. Caso contrário, não se
chega a ter justiça para com todos. Alguém ficará sempre fora do sistema. Para
que a acção social do Estado chegasse a todos, em todas as circunstâncias,
seria necessária um “super-burocracia”, que acabaria por desumanizar o apoio
social.
Nesse
sentido, é terrível e desumana a recente proposta comercial no Japão, para ir
ao encontro da solidão dos idosos: a chamada “cadeira do abraço”. Os idosos
precisam é do calor humano da presença e interesse dos irmãos. O mesmo se diga
dos doentes: «precisam sempre de algo mais que um tratamento tecnicamente
correto: precisam de humanidade, precisam da atenção do coração» (DCE 31)
O
próximo Domingo é o Dia Diocesano do Doente. Embora longe, quero sentir-me em comunhão
com todos os doentes dos Açores e com aqueles que, como eu, se encontram
deslocados no Continente. Esta é para mim uma nova experiência, que eu quero
viver solidariamente com os meus irmãos doentes, como “momento favorável” da
graça e da misericórdia divinas.
Verifico
com agrado que o apoio dado aos doentes açorianos deslocados no Continente
melhorou muito. Vimos, com tudo programado e previsto pelo Serviço de
Deslocação de Doentes do Hospital. Somos tratados com bastante competência e
humanidade, tanto pelas auxiliares e enfermeiros/as, como pelos médicos/as.
Pelo menos, é a experiência, que tenho tido no Hospital Pulido Valente.
Além
disso, podemos contar com o apoio permanente do Serviço de Apoio a Doentes
Deslocados (SADD), que se interessa continuamente por nós. Há uns anos atrás,
quando estive em Alfragide, procurei apoiar açorianos/as doentes, aqui em
Lisboa, que, além da doença, viviam dramaticamente a deslocação num ambiente
totalmente desconhecido, onde se sentiam perdidos. Tenho a sensação que as
coisas, graças a Deus, melhoraram bastante.
Que
S. José ampare todos os que ajudam os doentes!
+
António, Bispo de Angra
Alfragide,
19 de Março de 2015
Solenidade
de S. José, Esposo da Virgem Maria
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