HOMILIA DE MISSA NOVA DO PADRE NUNO MIGUEL COSTA FIDALGO VALE DAS FURNAS - 01 DE JULHO DE 2018
“Ide
por todo o mundo e pregai o Evangelho a toda a criatura.”
São as palavras que
revelam o grande desejo de Jesus de
que ninguém se sinta excluído da Luz que o Evangelho transporta. Evangelho tido
como Boa Nova, Boa notícia, não um role de condenações ou de orientações
morais. Evangelho/Boa Notícia que diga aos Homens deste tempo que Deus não se
esqueceu de nós, mas que deseja ardentemente fazer morada connosco.
Para continuar esta
Missão, Cristo escolhe
pessoas de fé frágil, gente imperfeita. Escolhe gente como nós, que aqui nos encontramos hoje
nesta Igreja. Gente como eu,
como tu, caro Padre Nuno Fidalgo.
O Padre não é
convidado a anunciar-se nem
a si mesmo nem às suas
conquistas, mas a anunciar
uma palavra que lhe roubou o coração, a anunciar aquele Jesus que o convenceu e
seduziu, a anunciar aquele
Jesus que o ligou a Si para toda a vida. Mesmo quando os outros não acreditam. Uma das experiências mais duras da
vida Sacerdotal é continuar a acreditar no fundamento do “Sim” dado na
Ordenação Sacerdotal, mesmo quando parece que não vale a pena, mesmo quando as
comunidades permanecem indiferentes. Isto porque “o anunciador deve ser
infinitamente pequeno, para que o anúncio seja verdadeiramente grande.”
Todos os baptizados,
mas em especial nós, os sacerdotes, recebemos a mesma Missão dos
Apóstolos: ANUNCIAR!
Querido Padre Nuno, repara como Jesus não nos diz: organizai, coordenai, governai, contabilizai, ocupai postos
de liderança,...(estes verbos continuam, infelizmente, conjugados exaustivamente pela Igreja
ainda nos dias de hoje), mas simplesmente ANUNCIAI!
Como estamos longe de cumprir o
que Jesus nos pede...
Que deve o Padre
anunciar? Nunca as suas ideias, por mais maravilhosas que sejam; nunca uma solução única para vários
problemas, nunca uma política ou teologia melhor, mas apenas e só o EVANGELHO DE JESUS CRISTO, que é a
Vida da nossa vida.
Anuncia que Deus te ama primeiramente e que tu
sentes e vives este amor. Deus é Amor, mas nós, embora vasos de argila, somos as torneiras que
derramam esse amor nesta terra. Aqui, como presbíteros, encontramos grandes
dificuldades: como poderá o Padre
anunciar o Amor se não se sente ele mesmo amado? Uma vez que não lhe é concedido o direito amar e ser amado, de constituir família, o Padre
corre o risco de se tornar numa fonte que secou. Cabe às comunidades cristãs
amar os seus sacerdotes para que esses possam continuar a sentir o Amor de
Deus. Quem vive sem Amor é estéril. O Amor é sempre portador de Vida. Aqui
pouco interessa o estado de Vida. Dizia-me o Padre José Piques, de quem tenho
muitas saudades: “quando pregares, fala
com o coração; se assim não for, mais vale estares calado”. Ainda hoje sigo
este conselho. Acredita que esta homilia foi preparada com muita emoção e
coração. É sincera...
Caro Nuno, o
celibato não anula as nossas faculdades afectivas; pelo contrário, pede-te que
alargues o coração até aos limites do mundo. Não te encontres só com celibatários. Se o fizeres, corres o risco de
limitar o teu desenvolvimento. Acolhe a todos, sem fazeres qualquer acepção:
aquela vizinha idosa, os noivos com quem te encontras, os adolescentes que
andam à procura de si, aquele
que já perdeu toda a esperança da sua recuperação... Abre-te sem qualquer
preconceito aos problemas do mundo. Procura cultivar amizades saudáveis
e sólidas. Nunca terás aceite o teu celibato se te mantiveres fechado numa
torre de marfim ou se te
instalares na vida... já que te pedem, contra
a natureza humana, que sacrifiques uma família que seja para o serviço de todos e bem de muitas outras.
Caro Nuno, não
posso terminar sem partilhar contigo algumas das minhas dificuldades na minha
pobre vida de Padre.
Sei que alguns
colegas meus, aqui presentes, irão dizer que estou a ser pessimista, que são estados de alma... Mas sinto-me com responsabilidade
de te dizer isto hoje
como sempre to disse quando privamos ao longo destes anos. Quando fui ordenado ninguém me
alertou para as dificuldades, falaram apenas no Alter Christus, por isso, os meus primeiros dois anos de padre, foram um inferno... Não desejo que seja assim contigo, meu caro afilhado Nuno. Sê forte,
escuda-te em Cristo.
A primeira
dificuldade que senti e ainda
sinto, é a da SOLIDÃO. Dizia o Doutor Caetano Valadão Serpa que “uma pessoa só é pouca gente”. E assim é
na verdade. Só o amor da tua família, amigos e paroquiamos podem aliviar –
embora não na totalidade - o fardo desta sensação de se sentir muito só no meio
de uma multidão.
A segunda
dificuldade que senti e sinto é a de aceitar a Cruz sem luta. Não me consigo resignar,
mesmo quando me pedem que acredite na “Teologia da Cruz”. Não aceito sofrer simplesmente
porque Cristo sofreu e aceitar todas as afrontas porque sou padre. Não te
deixes levar por falsas teologias que só servem para anestesiar as dores
sacerdotais, mesmo quando for o Bispo
a pedir-te. Enfrenta as dificuldades e sofrimentos, tenta superá-los. Deus criou-te para seres
feliz e não para o sofrimento (embora tenhamos de trilhar este caminho tantas e
tantas vezes; trilhar o caminho, nunca permanecer).
A terceira e, quiçá,
a mais dolorosa das dificuldades: é
sentir-se um inútil! Quando entregamos a nossa vida pelos outros e sentimos que,
do outro lado, não nos querem, não nos procuram, não sentem necessidade de um
Padre; quando procuramos ser
“um irmão entre irmãos” e sentimos que do outro lado querem alguém que
subjugue, que mande; quando entramos na Igreja ao Domingo, depois de termos preparado bem a Homilia,
quando rezamos a Palavra que vai ser anunciada e encontramos a igreja vazia...
aí sentimos bater cá
dentro o sentimento da inutilidade. Queres entregar-te, mas sentes que ninguém precisa de
ti... O mundo já não precisa de Deus...por isso, perguntamos a nós próprios, qual o sentido de
renunciar a tanto para ser padre?
No meio de tudo
isso, resta-nos Jesus Cristo que nunca nos falha. Entrega-te a Ele por amor. Só
o amor vale, só o amor dá sentido à vida, só amando nos realizamos. Sem amor
não há vida, não há cristianismo, não há santidade. Fora da esfera do amor não
se vive, vegeta-se.
Padre Nuno, peço-te encarecidamente, sê um padre do amor
num mundo que já se esqueceu o que é amar; sê um padre de esperança num mundo
que vive em desespero, sê um padre com coração num mundo que já o perdeu. Padre
Nuno, sê um padre ao jeito do BOM PASTOR.
Povoação, quarta-feira, 4 de julho de 2018.
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