MENSAGEM DE NATAL DE DOM JOÃO - 2018
«Despertar para o essencial da Vida Humana»
Tal como os pobres pastores e os magos
do oriente, descritos na cena evangélica do nascimento de Jesus de Nazaré,
também hoje nos deparamos com muita gente que coloca o seu olhar no céu para
dele receber o que na terra não lhe é oferecido.
No meio do frenesim económico e
material que invadiu a nossa sociedade, é difícil descobrir os verdadeiros
sinais que nos indicam o essencial da vida humana que só se detecta quando noas
abeiramos daquela criança, igual a todas as crianças do mundo, mas na verdade é
o Filho de Deus.
Por isso, a mensagem angélica que
anuncia que alguém nasceu para nós e que é portador de uma vida há muito
ansiada mas ainda não experimentada destina-se também a nós hoje, mergulhados
no individualismo e consumismo, seduzidos por um progresso atrofiador e
alienados em idealismos estéreis. Eis que surge a voz que nos convida a
reconhecer na pobreza do presépio a glória excelsa de Deus e que da fragilidade
de uma criança virá a paz autêntica para o mundo.
Daí soar aos nossos ouvidos e sobretudo
no nosso ser «glória a Deus nas alturas e paz na terra aos homens de boa
vontade».
Celebrar o Natal, o nascimento de Jesus
de Nazaré, é, ano após ano, caminharmos ao encontro do verdadeiro Mestre que na
sua postura de vida nos ensina o que é verdadeiramente viver humanamente.
Nascendo na pobreza, despertando, desde
a primeira hora, o olhar atento dos mais excluídos e oferecendo-se através da
simplicidade e da humildade como resposta à inteligência humana ávida de vida e
de verdade, está a indicar-nos a nós hoje o valor da vida humana vivida no
amor, na comunhão mútua, na generosidade, na partilha, no desprendimento
pessoal, na ternura, na compaixão e na abertura para Deus. Como refere S.
Paulo, «conheceis bem a bondade de Nosso Senhor Jesus Cristo que, sendo rico,
se fez pobre por vós, para vos enriquecer com a sua pobreza» (2Cor. 8,9).
Mas é sobretudo eloquente o convite a
caminhar para ir ao encontro daquele que, sendo Filho de Deus e portador de
Salvação, nasce na mesma humanidade que qualquer criatura humana.
O Natal é, deste modo, um convite a
caminhar na edificação de uma humanidade nova que tem o seu modelo em Jesus de
Nazaré. Como refere S. João Paulo II, «Jesus é o “homem novo” (cf. Ef 4,24; Col 3,10), que
convida a humanidade redimida a participar da sua vida divina» (NMI, 23). Na
verdade, «no mistério da encarnação encontram-se as bases para uma antropologia
capaz de ultrapassar os seus próprios limites e contradições, caminhando para o
próprio Deus, antes, para a meta da “divinização”, pela inserção em Cristo do
homem resgatado, admitido à intimidade da vida trinitária» (NMI, 23».
Eis o convite lançado a cada cristão e
cada comunidade cristã para crescer no encontro com Jesus de Nazaré e aprender
os traços de uma humanidade nova que tem um sinal eloquente no presépio;
convite lançado à sociedade e à cultura actual na qual a pessoa humana se sente
seduzida pelo imediatismo e pela matéria que ofuscam a verdade sobre o ser do
homem e da mulher criados e redimidos por Deus para que se abram à Boa Nova
proclamada pelo nascimento do Filho de Deus porque «o mistério do homem só no
mistério do Verbo encarnado se esclarece verdadeiramente» (GS, 22).
Caminhar ao encontro de Jesus de Nazaré
é deslocar-se para ir ao encontro dos que na sociedade esperam a sua
libertação, nomeadamente os pobres, os excluídos, os marginalizados, os
refugiados, os migrantes, isto é os que anseiam por uma vida autenticamente
digna.
O Natal comporta uma decisão firme que
leva a uma opção em favor dos mais débeis e desprotegidos para lhes devolver a
esperança. Contudo, para que tal se concretize exige-se partilha e comunhão
efectivas, não só de bens materiais mas da pessoa em si mesma, tendo como
exemplo a Jesus de Nazaré que «pela sua encarnação, Ele, o Filho de Deus,
uniu-se de certo modo a cada homem» (GS, 22). Foi tal a solidariedade com a
condição humana que «trabalhou com mãos humanas, pensou com uma inteligência
humana, agiu com uma vontade humana, amou com um coração humano» (GS, 22). De
facto, «nascido da Virgem Maria, tornou-se verdadeiramente um de nós,
semelhante a nós em tudo, excepto no pecado» (GS., 22).
É nestes sentimentos de profunda
comunhão entre todos os homens e mulheres que vivem, sofrem e lutam, se
interrogam sobre o seu futuro ou porventura ainda não despertaram para a sua
vocação sublime como filhos de Deus, que expresso os meus votos de Santo e
feliz Natal para todos os diocesanos sejam os que vivem nos Açores seja os que
se encontram na diáspora.
Angra do Heroismo, 10 de Dezembro de
2018
+João Lavrador, Bispo de Angra e Ilhas
dos Açores
Povoação, sábado, 15 de dezembro
de 2018.
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