NAMORADOS QUE SE PREZAM DE O SER
Celebramos o Dia dos Namorados em dia
de São Valentim. Saudações amigas para todos e votos de muitas felicidades. Os
vários interesses da sociedade sempre falam mais alto do que a criatividade de
quem sente a responsabilidade de motivar os jovens para o dever que lhes cabe
de se irem preparando para, quando o tempo chegar e se for essa a opção, puderem
constituir famílias saudáveis e felizes. Entendo que esta preocupação e tarefa
deveria ser sentida por todos como causa própria: por famílias, comunidades
cristãs e outras comunidades, instituições, pessoas de boa vontade e pelo próprio
Estado. Aprofundar e educar para os valores e a riqueza da família vai sendo
coisa rara. Não só por isso, mas também por isso, as falências familiares
multiplicam-se. É verdade que, por razões várias e nem sempre prevenidas, pode ter-se
chegado a situações em que a separação seja totalmente inevitável, como remédio
extremo e até moralmente necessário. Sim, exceções sempre houve, é verdade, mas
vai-se constatando que a exceção teima em se impor como regra. A sociedade, já tristemente
eivada pelo fenómeno, surge apenas com grandes preocupações em remediar os seus
efeitos, com tribunais, leis sem conta e minuciosas e, por vezes, em situações
duvidosas, até deixa transparecer excesso de zelo que só faz sofrer. Gostaríamos
que, mesmo remediando os efeitos, cuidasse mais do tratamento dessa doença
social. Isso, porém, não acontece, antes pelo contrário. A sociedade mofa da
estabilidade conjugal e das famílias numerosas, promove e divulga contravalores
familiares, ensina coisas, coisas que, sem educação e valores, podem ser muito
importantes e necessárias, mas vão gerar superioridades autorreferenciais e empresários
do descarte, do usa e deita fora.
Apesar de
tudo, apesar dos ventos contrários e das águas movediças, apesar de aparentarmos
ser vozes solitárias a clamar no deserto, não podemos desistir de remar contra
a maré. Vamos fazendo a nossa parte com pena de nem sempre ser da melhor forma
ou da forma mais eficaz. É como sabemos e podemos, sempre com humildade e
respeito pelas pessoas. Conhecedora da história e com uma história de dois mil
anos, a Igreja não esquece que a destruição da família nunca conduziu as
sociedades a bom porto. A Exortação Apostólica do Papa Francisco sobre a
Alegria do Amor, sobretudo no seu capítulo VI, aponta-nos caminhos pastorais para
um sério empenhamento na preparação para o matrimónio dos jovens cristãos e dos
de boa vontade. O namoro é um direito e um dever para quem deseja constituir
família. É um tempo necessário para individualizar convergências, incompatibilidades
e riscos. Não deve esconder ou relativizar o que é importante avaliar, nem evitar
as discordâncias ou adiar as dificuldades. No entanto, se tudo acontece de
braço dado com o controlo, ameaças, agressões, chantagens, difamações, medos,
manhosices: se isso acontece, melhor será ter a coragem de acabar, não há
educação humana nem as mínimas condições exigidas para prosseguir. Cada um deve
sentir-se no dever de expressar ao outro o que entende e espera dum eventual
matrimónio, comunidade de vida e de amor aberta à vida. Deve expor o seu
entendimento sobre o que é para si o amor e o mútuo compromisso. Deve partilhar
o que deseja do outro e o tipo de vida em comum que sonha e gostaria de
concretizar. Deve detetar, antes do matrimónio, os sinais de perigo que a
relação pode vir a apresentar e se há meios que permitam enfrentá-los com êxito.
Só a verdade liberta e constrói. O namoro ajuda a entender quais são os pontos
de proximidade: se os há, se os não há, se são escassos, se são incompatíveis e
sem solução, se são passíveis de uma caminhada conjunta. Ninguém ama o que não
conhece e muitos decidem casar sem se conhecerem tanto quanto baste. Divertem-se,
fazem experiências juntos, mas não enfrentam o desafio de se manifestar a si
mesmos e apreender quem é realmente o outro. Aprender a amar alguém não é algo
que se improvise ou se decida já e agora, sem demora, idealizando paraísos. A
mera atração mútua, se é importante, não será suficiente para sustentar uma união
estável e feliz. Há que aprofundar outras motivações que confiram ao possível
matrimónio reais possibilidades de estabilidade e êxito, sem atitudes
interesseiras ou jogos de tipo comercial. O matrimónio é uma questão de amor
entre um homem e uma mulher que se escolhem livremente e se amam, passando de
uma atração inicial, à necessidade do outro, do outro sentido como parte da
própria vida. Se o amor se reduzir a uma mera atração ou a uma vaga
afetividade, é de prever que o casal venha a sofrer grande fragilidade quando a
afetividade entrar em crise ou a atração física diminuir. E muitas vezes o
tempo de namoro e noivado é curto e leve, não é suficiente para uma verdadeira maturação.
Por isso, depois se casarem, muitos continuam, e bem, a completar aquele
percurso nos primeiros anos de vida matrimonial, enriquecendo e aprofundando a
decisão consciente e livre de se pertencerem e amarem até ao fim. Os movimentos
da pastoral familiar e as equipas de espiritualidade conjugal são um excelente
meio para este crescimento. Como afirma Francisco, o amor é artesanal, o
matrimónio é um caminho dinâmico de crescimento e realização, é um projeto
sempre inacabado.
Os jovens,
aqueles que têm a sorte de ser contagiados na dinâmica do amor e na abertura à
comunidade pelo testemunho familiar, são os primeiros a saber aproveitar as instâncias
e iniciativas de formação que a comunidade cristã oferece: os grupos de jovens
com as suas atividades e convívio, os grupos de noivos, a ação social, a
integração na vida eclesial, a oferta de palestras sobre uma variedade de temas
que realmente interessam aos jovens, incluindo a castidade, os cursos antes da
celebração do matrimónio, a possibilidade de alguns momentos personalizados,
dado que o principal objetivo é ajudar cada um a aprender a amar a pessoa
concreta com quem pretende partilhar a vida inteira, etc. Como se lê no
documento, não se trata de saber o Catecismo inteiro nem de ficar empanturrado
com o excesso de temas. Não é o muito saber que enche e satisfaz, mas o sentir
e saborear interiormente as coisas, amadurecendo o amor e ganhando resistências
saudáveis para o que de menos bom poderá surgir. Por isso, a prioridade é dada
àqueles conteúdos que ajudam a celebrar o matrimónio com as melhores
disposições e a começar a vida familiar com alguma solidez, alegria e esperança.
Estas ajudas não são apenas doutrinais ou recursos espirituais que a Igreja
sempre oferece, como a Reconciliação sacramental, os momentos de oração a sós e
juntos, a oração de um pelo outro e de ambos a Deus para que sejam fiéis e
generosos ao que Deus espera deles, a consagração do seu amor diante duma
imagem de Maria... Devem ser também percursos práticos, conselhos bem
encarnados, estratégias tomadas da experiência, orientações psicológicas,
indicação de lugares e pessoas, consultórios ou famílias prontas a ajudar,
aonde poderão dirigir-se em busca de ajuda se surgirem dificuldades. Tudo isto
cria uma pedagogia do amor que, tendo em vista a sensibilidade atual dos jovens,
os leva a querer assumir o matrimónio como uma vocação que os lança para
diante, com a decisão firme e realista de atravessarem juntos as provações e os
momentos difíceis até que a morte os separe (cf. AL206-214).
Antonino
Dias
Portalegre-Castelo
Branco, 15-02-2019.
Povoação,
segunda-feira, 18 de fevereiro de 2019.
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